Dra. Valquíria Barreto, a Delegada das Mulheres

De acordo com a titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, em Sete Lagoas são emitidos cerca de 50 a 60 pedidos de medidas protetivas ao mês pelo Poder Judiciário

Por Priscila Horta

À frente da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher de Sete Lagoas, Dra. Valquíria Barreto fala da necessidade de vocação para ingresso na polícia, sobre as maiores demandas do município e indica que o combate à violência contra a mulher passa pela difusão da educação: “A mentalidade das pessoas precisa mudar!”. Ela também afirma que “a mulher que procura a polícia e a rede de apoio municipal não está ficando desamparada”.

QUEM É
Valquíria Carvalho Barreto, nascida em Sete Lagoas, estudou o ensino fundamental e médio em escola pública e foi aluna bolsista no ensino superior em virtude da boa nota no ENEM ao alcançar a nota máxima na redação. Formada em Direito no UNIFEEM, foi aprovada no primeiro concurso ainda durante a graduação, oportunidade em que se tornou servidora pública federal do Ministério do Trabalho.
No Ministério do Trabalho, trabalhou por 11 anos e pediu exoneração para ingressar como Delegada de Polícia Civil em Minas Gerais, em 2021. A primeira atuação foi no Vale do Jequitinhonha, na cidade de Minas Novas, onde considera que adquiriu muitas experiências positivas na carreira. Desde agosto de 2022, é a titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher de Sete Lagoas.

SETE DIAS – Na Delegacia da Mulher, você exerce uma profissão de alto risco. Qual o maior desafio desse trabalho?
Dra. Valquíria Barreto – Quando decidimos nos tornar policiais, já temos alguma noção de que nosso papel é proteger a sociedade, o que nos coloca em estado de alerta. De fato, logo que começamos a aprender sobre nossa função e a exercer nossa profissão, percebemos o peso da responsabilidade. Por isso, sempre falo da necessidade de vocação para ingresso na polícia, porque a vida glamourosa do delegado de polícia que as redes sociais mostram não condiz com a realidade. Lidamos muitas vezes com a falta de recursos materiais e humanos, passamos por situações de estresse, plantões de trabalho e desafios que apenas alguém vocacionado e preparado consegue enfrentar.

SD – O que você não conseguiu executar e pretende realizar nos próximos anos à frente da Delegacia?
Dra. Valquíria Barreto – Percebo que, cada vez mais, a pauta de proteção das mulheres e de outros grupos vulneráveis tem ganhado força em diversos ambientes, seja nos órgãos governamentais ou na sociedade civil. Muitas mudanças já ocorreram e muitas estão sendo programadas no sentido de expandir a proteção e a luta contra a violência. Hoje, Sete Lagoas vive um cenário muito favorável, pois o Poder Executivo atual está totalmente voltado à questão da política social envolvendo as mulheres, tanto que recentemente foi criada a Secretaria da Mulher. A Polícia Civil também está cada vez mais investindo nas Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher, e todo esse investimento trará grandes resultados. Creio que nunca houve uma situação tão favorável como essa que estamos vivendo.

Dra. Valquíria Barreto com a equipe da Delegacia das Mulheres

SD – Na prática, como está a estrutura de apoio às mulheres na Delegacia Especializada?
Dra. Valquíria Barreto
– A municipalidade tem sido uma grande parceira da Delegacia, nos apoiando em inúmeras ações. Creio que um marco importante foi a criação da Secretaria da Mulher, pois agora temos um local para encaminhar as mulheres que precisam de amparo para conseguirem sair do ciclo de violência. A atual secretária, Dra. Karine, tem atuado de forma ímpar, como uma verdadeira parceira da Delegacia. Cito ainda a atual gestão do Executivo municipal, que, sensibilizada com as necessidades e peculiaridades da Delegacia de Atendimento à Mulher, disponibilizou duas psicólogas para darem suporte às mulheres. A experiência tem sido absolutamente benéfica, pois propiciou um atendimento mais humanizado. Nunca estivemos em um cenário tão favorável como o atual.

SD – Quantos casos de feminicídio foram registrados em Sete Lagoas em 2023 e 2024?
Dra. Valquíria Barreto – Nos anos de 2023 e 2024, tivemos três feminicídios consumados em cada ano.

SD – Qual é a dimensão da Delegacia hoje? Quantos atendimentos são realizados, e o que é oferecido lá?
Dra. Valquíria Barreto
– Hoje a Delegacia de Atendimento à Mulher é competente para os crimes contra as mulheres em um contexto de violência doméstica e familiar, bem como todos os crimes sexuais, inclusive envolvendo crianças e adolescentes, os quais são as maiores demandas. Realizamos confecção de boletins de ocorrência, etapa necessária para a instauração dos demais procedimentos, bem como instaurados inquéritos policiais e requerimentos de medidas protetivas. A equipe que trabalha na Delegacia, a qual eu orgulhosamente chamo de ” minha equipe”, policiais e cedidos pelo município, são pessoas diferenciadas e escolhidas por vocação, sendo produtivos, inteligentes, proativos e empáticos. O horário de atendimento da Delegacia de Atendimento à Mulher é de 8h às 12h, e de 13h às 17h. Lembrando que para situações de flagrante a Polícia Civil nunca se fecha, funcionando a delegacia de plantão todos os dias da semana e 24 horas por dia – para todo e qualquer crime em situação de flagrante.

SD – Quais são as principais demandas da Delegacia da Mulher e como avançar no combate à violência doméstica?
Dra. Valquíria Barreto – São os requerimentos de medidas protetivas de urgência, totalizando uma média de 50 a 60 pedidos ao mês. Medida protetiva de urgência é uma cautelar solicitada pela mulher ao Poder Judiciário que busca o afastamento do agressor do convívio da vítima. A Delegacia é o local onde tal requerimento é feito. Em Sete Lagoas a Vara da Violência Doméstica exerce um papel espetacular, proporcionando uma tutela jurisdicional rápida e efetiva: às vezes a mulher vai até a Delegacia na parte da manhã e no mesmo dia ou no dia seguinte o oficial de Justiça já está intimando o agressor. Da mesma forma, o Ministério Público atua de uma maneira singular no município, com celeridade, efetividade e em uma parceria muito grande com a Polícia, o que muito privilegia o interesse público. No que concerne aos inquéritos investigativos, a maior demanda são os crimes de ameaça, lesão corporal e injúria. Creio que o principal mecanismo para se avançar no combate à violência contra a mulher é a difusão da educação de respeito em todos os níveis de ensino. A mentalidade das pessoas precisa mudar.

SD –  Neste mês de reflexão, pelo Dia Internacional da Mulher, o que você recomenda principalmente às mulheres?
Dra. Valquíria Barreto – O principal conselho é: caso você, mulher, sofra algum tipo de violência ou conheça alguém nessa situação, encoraje-se a ir até a Delegacia. Sabemos que a imprensa divulga alguns canais de contato que, de certa forma, são efetivos, como os disque-denúncias. No entanto, nada é mais efetivo do que a ida da mulher até a Delegacia. Muitas mulheres acham que só o fato de entrarem na Delegacia já gera um registro oficial, e ficam receosas, mas não é assim. Somente tomamos alguma providência ou registramos ocorrência se a pessoa atendida nos autorizar. Como disse, nunca estivemos em um cenário tão favorável para as mulheres, tanto pelo apoio da política pública municipal quanto pelas parcerias com empresas e instituições que oferecem suporte. A mulher que procura a polícia e a rede de apoio municipal não está ficando desamparada.

Delegacia Especializada fica na rua Jovelino Lanza 1613 – Jardim Arizona.