CPA em visita à Escola Emílio de Vasconcelos Costa durante a elaboração de um projeto.
A participação dos adolescentes nas decisões que afetam suas vidas é um direito e, ao mesmo tempo, um grande desafio. Em Sete Lagoas, esse desafio começou a ser enfrentado de forma concreta com a criação do Comitê de Participação de Adolescentes (CPA), um espaço inovador dentro do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA).
Criado em 2023, o CPA tem como missão garantir que os jovens da cidade possam não apenas opinar, mas também influenciar as políticas públicas voltadas à infância e juventude. Iniciativas como essa ainda são raras no Brasil: Minas Gerais conta com apenas cinco comitês semelhantes, e a nível nacional, a participação direta de adolescentes nos conselhos de direitos ainda é um processo em construção.
Para entender melhor essa iniciativa, conversamos com Rachel Branco e Ribeiro, diretora do CMDCA e uma das responsáveis pela implementação do CPA, e com a jovem Ana Luiza, diretora do comitê, que compartilhou sua experiência como representante dos adolescentes nesse espaço.
A Criação do CPA: Um Caminho de Resistência e Persistência
Rachel Branco e Ribeiro acompanha a luta pela participação de adolescentes no CMDCA há anos. Psicóloga de formação, ela se engajou na causa da proteção à infância e adolescência quando assumiu a coordenação do Serpaf (Serviço de Promoção ao Menor e à Família). Em 2017, passou a representar a instituição no conselho e percebeu a necessidade de incluir os adolescentes nos debates sobre políticas públicas.
“A participação de adolescentes na formulação e monitoramento das políticas públicas para crianças e adolescentes é tão essencial quanto a participação de mulheres nas políticas para mulheres ou de pessoas negras nas políticas de igualdade racial. Não há como criar políticas públicas eficazes sem ouvir aqueles que serão diretamente impactados por elas”, destaca Rachel.
A ideia do CPA enfrentou resistências dentro do próprio CMDCA. Muitos membros não conseguiam enxergar como a participação dos adolescentes poderia ser estruturada de forma significativa. Mesmo assim, Rachel persistiu e, em 2023, conseguiu aprovar a resolução que criou o comitê. O processo de mobilização também não foi fácil: no primeiro edital de eleições, apenas quatro adolescentes se inscreveram para as dez vagas disponíveis. Após novos esforços, em abril de 2024, finalmente foram empossados 12 adolescentes para compor o CPA de Sete Lagoas.
“Hoje temos um grupo autogerido, que já discute melhorias para áreas de lazer da cidade e busca mobilizar outros adolescentes. A participação efetiva deles é um avanço gigantesco”, comemora Rachel.
Ana Luísa é jovem aprendiz pela prefeitura, tem 16 anos e foi eleita diretora do Comitê pelos Membros Jovens.
A Voz dos Adolescentes: O Que o CPA Representa?
Entre os jovens que assumiram esse papel de protagonismo está Ana Luiza, que entrou no CPA por meio do Serpaf. Para ela, a experiência tem sido transformadora, pois finalmente encontrou um espaço onde pode expressar suas ideias e lutar por mudanças reais.
“O maior ponto positivo do CPA para mim é poder expressar minhas opiniões e garantir que as perspectivas de outros adolescentes também sejam ouvidas”, afirma Ana.
Mesmo com esse avanço, Ana acredita que os adolescentes ainda não têm seus direitos e deveres plenamente respeitados. Segundo ela, há uma cobrança excessiva sobre os deveres dos jovens, enquanto seus direitos nem sempre são garantidos.
“Acho que ainda não conseguimos ser respeitados como deveríamos. Muitos direitos não são cumpridos, e quando se trata de deveres, às vezes a cobrança é desproporcional”, ressalta.
Sua maior luta dentro do CPA? Educação de qualidade e equilíbrio entre direitos e deveres. Ela sabe que o caminho será longo, mas acredita que vale a pena.
“Minha maior luta será garantir o bem-estar dos jovens, acesso à educação de qualidade e equilíbrio nos direitos e deveres. Vai ser difícil, mas sei que valerá muito a pena”, reforça.
Jovens do CPA apresentando um ofício na Câmara dos Vereadores.
Um Recado Para os Adultos: Escutem os Jovens!
Se há um pedido que Ana Luiza gostaria de fazer aos adultos, ele é simples e direto: escutem os adolescentes!
“Muitas vezes, os adultos tomam decisões que impactam diretamente os jovens sem ao menos nos perguntar o que pensamos. Talvez achem que não temos maturidade suficiente, mas muitos adolescentes têm muito a dizer. Se tivermos espaço para falar, podemos trazer soluções inovadoras”, finaliza.
Jovens durante uma reunião com membros do Parlamento Jovem, a fim de apresentar projetos.
Rachel reforça essa mensagem e deixa um recado especial para os adolescentes do CPA:
“A contribuição para as políticas públicas é um processo árduo e contínuo, que exige persistência e foco. Vocês estão construindo uma história inédita em Sete Lagoas. Espero que um dia olhem para trás com orgulho de tudo o que conquistaram.”
O CPA de Sete Lagoas é uma prova de que, quando os adolescentes são ouvidos e têm espaço para agir, podem transformar a realidade. Afinal, quem melhor para falar sobre juventude do que os próprios jovens?