Crítica: Coringa – Delírio a dois

Crônica de Wellberty WollyvierO que era ruim ficou ainda pior.

Imagem: divulgação

O primeiro Coringa, dirigido pelo diretor de comédias Todd Phillips (trilogia Se Beber, Não Case), dividiu a opinião da crítica. Eu, particularmente, achei uma porcaria, mas é inegável a entrega de Joaquin Phoenix ao personagem, tanto que conquistou o Oscar no ano seguinte. Seu Coringa, Arthur Fleck, nunca existiu nos quadrinhos; o verdadeiro nome do Coringa é Jack Oswald White. Nos quadrinhos, nunca se cogitou a possibilidade de ele ser irmão do Batman, e sua mãe nunca teve um caso com o pai de Bruce Wayne. Outra mudança muito grande é que ele não se descobre louco do dia para a noite; ele é um psicopata por essência. Um dos melhores momentos do Coringa nos quadrinhos foi quando ele matou o parceiro do Batman, o segundo Robin (Jason Todd), em Adis-Abeba, na Etiópia, na frente de sua mãe. Ele o mata de forma sádica com um pé de cabra, um dos momentos mais violentos das HQs do Batman.

Outra coisa é a risada do Coringa: no filme, ele ri em momentos nervosos, quando se sente incomodado com algo; nas HQs, ele ri por psicopatia, porque gosta de ferir as pessoas e sente prazer com isso. Arlequina é igualmente psicopata, e outra mudança radical é que, nos quadrinhos, ela é uma psiquiatra que se envolve com o Coringa, e não uma paciente como no filme.

Sei que filme é filme e quadrinho é quadrinho, mas o Coringa criado por Todd Phillips é um ser patético, cuja violência é rasa e sem profundidade. Colocá-lo com epilepsia gelástica para identificar sua risada incontrolável é uma falta de compromisso com o material original sem precedentes. Neste segundo filme, a mistura de anarquia, comédia, drama e musical deu muito errado, principalmente a parte musical. Primeiro, porque não há nenhuma música inédita no filme; são todas amplamente conhecidas, e os números musicais são de uma pobreza que lembra muito Cats.

No início do filme, o Coringa está apático, tedioso, carcomido, mas é só ver Harley Quinn, a futura Arlequina, interpretada pela magistral Lady Gaga, o que, por si só, já é um erro, pois o verdadeiro nome da Arlequina é Harleen Frances Quinzel. Por ser um filme fora do universo DCEU e DCU, pode-se tomar algumas liberdades narrativas. Porém, ignorar anos e décadas de uma história que já virou um cânone é, no mínimo, aterrador.

Se formos olhar bem, o primeiro Coringa é a história de um palhaço frustrado, com um trabalho que ele não gosta, sem relacionamentos, que um dia, do nada, enlouquece, mata algumas pessoas no metrô, um apresentador ao vivo, e vai parar em um manicômio. E é só isso. Então, para que chamar o filme de Coringa e não de Palhaço Paçoca? Não havia e não há necessidade de sua intrusão no universo do Batman; ele é um palhaço qualquer e em nada lembra o Coringa das HQs.

Para piorar, o filme custou absurdos 200 milhões de dólares. Para se pagar e ter um lucro razoável, tem que chegar na casa dos 450 milhões de dólares de bilheteira, o que, inequivocamente, não vai acontecer. Para agravar, Lady Gaga está muito triste; tinha esperança até de uma indicação ao Oscar, tadinha. Ela se esforça, mas o problema não é ela, e sim o roteiro rocambolesco, farsesco e sem graça do filme. Nada se salva aqui, nem as músicas, que são covers bem mais ou menos.

O filme pode ser assistido nos cinemas.

Nota do filme: 3,5/10

Wellberty Wollyvier – Formado em Artes Cênicas pela UFMG, Crítica e análise de filmes pela faculdade do Rio, escreve sobre cinema desde 1997, autor e dramaturgo publicado em 16 países com mais de cem obras escritas.